Saturday, September 22, 2018

Outras Viagens

Viajar em trabalho muda-nos o foco das prioridades de quando viajamos em lazer. O trabalho é o objectivo, a viagem é o meio. Havendo a possibilidade de conhecer algum lugar novo, outras culturas, outras gentes, aproveita-se como um beneficio extra da obrigação. É um beneficio que procuro muitas vezes, mas desta receava não encontrar. Estes 3 dias adivinham-se duros. Sabia que além do que me levava ali, havia o que preenchesse as horas além do dia por outras obrigações paralelas... Além de que esta era a semana mais cobiçada para aquela cidade, por vários eventos de diferentes áreas a escolherem para acontecer e por isso a logística normal ter sido mais difícil.

O Hotel era longe, novo, diferente do costume e isolado. A difícil acessibilidade (a meu ver) preocupava-me para a manhã seguinte. Afinal o dever chamava-me e a exigência da pontualidade não me relaxava. Quando dou o meu nome para confirmar a reserva, a resposta não foi imediata. Algum idioma além do francês do lado de lá do balcão da recepção era inexistente. Em nenhum dos 3 cartõezinhos para os hospedes daquela noite estava o meu nome. Já passava das 10h… O recepcionista, depois de verificar a lista impressa dos clientes daquele dia 4 vezes, pegou no telefone para ligar à chefe, que tinha o mesmo nível de inglês que ele próprio, ou seja, o nível do meu francês. Passou-me o telefone e foi conversa de surdos. A senhora desligou sem dizer nada e em menos de um fosforo estava atrás de mim. Não temos quarto para si, lá percebi entre gestos e palavras soltas. A reserva não foi feita. Nem o email que mostrei, recebido como confirmação dessas plataformas que supostamente ajudam a pessoa a marcar hotéis, foi prova que bastasse. Culpando a plataforma, tirando de si a responsabilidade, começou à procura de alternativa. Ligava para hotéis da zona sem qualquer manifestação de estar a atender um cliente. A sua cara de base branca, com umas enormes pestanas pretas carregadas de rímel, realçando o loiro mais branco ainda manifestamente falso, não declarava qualquer indicio do que estaria ela a fazer. Estávamos perdidos na tradução… Há um hotel, vou chamar um táxi. Não há táxis… Mais uns minutos de não interacção pessoal e diz-me que há um quarto. Por magia, um daqueles cartõezinhos afinal não tinha dono e ficou para mim. Mas só por aquela noite. A possibilidade de estender para as 3 que eu precisava, e tinha marcado, não existia. Na verdade, eu já nem queria. O stress e o medo de estar algures em parte incerta assaltaram-me roubando-me a paciência e a compreensão. Para se desculpar ofereceu-me o pequeno almoço. Levou-me ao quarto que me destinou daquele hotel de beira de estrada de clientela duvidosa com porta directa para rua. Parti na manhã seguinte antes da hora antecipando atrasos pela longa (ou desconhecida) distancia, ou trânsito, ambicionando conseguir um hotel normal e numa zona conhecida.  

Missão para o dia, encontrar um hotel para a noite. Ainda faltavam duas… No meio da reunião com o cliente, as plataformas já pouco credíveis eram o meu ecrã. A atenção disparava para os dois sentidos, premiando a reunião em detrimento da pesquisa aumentando a angustia. Várias frentes procuravam o mesmo. Várias zonas da cidade eram sugeridas. O orçamento possível, esse, era imutável, o que dificultava a procura. A estratégia passou rapidamente para procurar uma mais uma noite, em vez de duas seguidas.  Já passava das 5 da tarde quando apareceu uma combinação possível, zona, preço e apenas uma noite, graças à preciosa ajuda vinda de Lisboa por quem nos ajuda nestes temas. Era no centro da cidade. Muito fácil acesso, via comboio e depois metro. Seguindo as indicações de saída da estação de comboio, dei por mim e estava na rua. A alternativa sugerida por uma colega local, de em vez de metro fazer 15 minutos a pé foi a escolhida. 15 passa a 20 dado os saltos, a mala, a noite mal dormida e um dia em cima. Chego ao hotel o meu nome estava no cartãozinho. Já não ia para cedo, mas a certeza de saber onde estava e ter uma cama para dormir, abriu o apetite e fez-me sentar numa esplanada típica da zona agitada. Ali sim, estava segura, tranquila e animada. Ainda nesse dia tínhamos encontrado outro hotel para o dia seguinte. Saí de manhã de malas atrás, depois de mais um check-out, e segue para o comboio. Passa-se o dia tranquilamente na certeza de ter um teto para dormir à noite e volta ao comboio. Segui a direcção até à estação indicada por quem conhece e de seguida rumo ao hotel. O meu nome não estava na lista. Pedimos desculpa mas a sua reserva não ficou confirmada. Quem a fez foi avisado hoje de manhã. Voltei a mostrar o email de confirmação enviado por outra dessas plataformas, mas nada. Que faço eu à minha vida agora, pensei! Demorei 5 longos segundos a voltar a mim e perguntei como pensava ela resolver a questão. A recepcionista era única. A fila de hospedes era alguma. Todos iam recebendo o seu cartãozinho, e eu nada. Liguei para quem tinha feito a reserva. Mais uma dessas plataformas facilitadoras nas quais não podemos confiar. Expus o caso, aqui todos falávamos a mesma língua, e perguntei como iriamos resolver. Pediu-me que aguardasse em linha, que ia entrar em contacto com o hotel. Eu fiquei a ouvir em estéreo a música do senhor da plataforma que marca hotéis de um lado e a recepcionista do hotel do outro, a falarem entre eles. Depois de mais alguma conversa e de aguardar um pouco com outro pedaço de música recebo a noticia de que encontraram um hotel. Foi o senhor da plataforma. Só que era um pouco acima do orçamento, e acima da reserva feita, pois o único quarto disponível era gama conforto. Um ou dois níveis acima do quarto simples daquele hotel de 4 estrelas. Mas entre o hotel e a plataforma alguém cobriria a diferença… recebi mais um email de confirmação da reserva e pedi para me chamarem um táxi. Nisto eram quase 9 da noite e havia ainda trabalho para fazer e tentar comer qualquer coisa entretanto. Chego ao outro hotel, e volto ao ritual do costume. Dou a minha identificação e espero. Espero. Espero. O senhor era novo ali talvez… pensei. Finalmente lá olha para mim e pergunta, onde é que fez esta reserva? Mostrei o email de confirmação e esperei outra vez, calmamente. Já sei que o stress não ajuda e a pressa é inimiga da eficiência e da solução. Não temos este quarto… vou ter de lhe dar outro de um nível abaixo, que por acaso temos livre… pedimos imensa desculpa pelo sucedido. Nem sei como é que conseguiu marcar este quarto. Mas claro que para mim, depois de 2 noites e 3 hotéis, o nível básico de quatro estrelas numa zona nobre da cidade, seria mais que suficiente. Eu só queria fazer o check-in e descansar. Amanhã quando sair faço a reclamação. Posso oferecer-lhe o pequeno almoço… No dia seguinte lá fiz mais um check-out, o terceiro em 3 dias.
Tudo corre bem quando acaba bem! 

Até à próxima!

Monday, October 18, 2010

Tuesday, December 8, 2009

Finalmente em Livro

Lançado no dia 11 Dezembro de 2009 na livraria Bertrand do CCB.

Sinopse:

"A pergunta era simples "Queres vir dar a volta ao mundo comigo?".
A resposta complexa.

Em cima da mesa estava um emprego estável, uma vida organizada, um percurso mais que previsível, e em simultâneo uma vontade de questionar, de pôr em causa, de chegar mais longe... a resposta foi sim!

De regresso, 360º volvidos, Rita traz na bagagem os relatos de um ano de viagem aos recantos mais improváveis deste mundo, realtos de uma clareza sibtil, que trazem ao nosso encontro os cheiros, as chuvas, o calor, os risos e as gentes com quem se foi cruzando.

Da Índia à Ilha da Pascoa, passando pelo Laos, Vietneme, China, Nova Zelândia e outros mais, encontramos nestas páginas pequenos paralelos com o nosso mundo, erguem-se perguntas, surgem ideias, equacionam-se hipóteses... E diante dos nossos olhos vimos surgir novas coordenadas de um novo mapa mundo interior, que nos interpela e nos faz querer fazer as malas e partir também ao encontro de nós próprios!"

Monday, August 24, 2009

Maravilhas de Portugal II

Só depois de lá estar me apercebo da saudade que aquela praia me fazia sentir faz tempo. Pode tudo mudar, pode tudo evoluir, pode até tornar-se impessoal, mas o que se lá viveu não se esquece, e a maravilha da natureza continua a ditar o que sempre proferi daquele lugar. Mais uma beleza natural aqui tão perto, ao nosso lado. A memória do passado emerge cada vez que a visito. A recordação imortaliza a vista. Protege-a de qualquer aberração edificada a tentar amachucar a envolvente. Essa paisagem, para mim, será sempre a que trago comigo. Aquela que criei com o que vivi e com o que vivo. Volto a ser influenciada pelas reflexões de Ortega, que mais uma vez me inspira confirmando nas suas palavras as ideias alojadas em mim há tanto.

O areal selvagem ainda longe da mão urbana é culpado da minha conservada convicção. O progresso visita aquela vida piscatória, como qualquer outra que tem no turismo muito do sustento, mas deixa que ela se mantenha o nosso refúgio de férias como desde o primeiro ano, ainda antes de ter capacidade de materializar o sentimento fincado até hoje.
Nem eventual longo caminho nos inibe de querer sair para lá, longe é onde não se quer ir. As alternativas de rota são várias, quebrando a monotonia da viagem que ás vezes me invade só por culpa do meu imaginário criador de imagens irreais e manipuladoras de vontades. Desta vez, fugindo a Foros de Pouca Farinha, evitando Vila Franca do Rosário ou Ribeira da Azenha, apanho a estrada de Gasparões. Quantos mais lugares nos esconde o mapa? São inúmeras as aldeias, vilas, aglomerados de casas que vivem em tom de urbe, que nos ditam a certeza do caminho certo, adivinhando o tempo para a chegada. É ao passar o café Rita, depois daquele redondel que se mostra estanque, mantido há anos igual, orientando para diferentes zonas do sudoeste alentejano, que sei que a chegada não tarda. A entrada da vila, cada vez é mais antes de chegar, torna a tabuleta que indica 1 Km obsoleta, mas continua a criar o frio impaciente na barriga que acelera o pulsar vertiginosamente. Já não aguento a ânsia… essa tabuleta peca por defeito em relação à verdadeira distância para chegar a casa, aquela longe do centro urbano, de onde o descanso e o repouso não saem e nos esperam sempre de braços abertos.

Arrisco dizer que melhor ócio do que aquele é difícil. Ali, naquela paz ao som da natureza em bruto, o mar grita-nos a intensidade da sua raiva, ou sem se fazer ouvir mostra-se o mais calmo. A luz de fim de tarde rouba o tempo, faz crer que estou parada no curso das horas. Nada se move, nada acontece, a calmaria ouve-se e desfruta-se.

Ainda que num refúgio longe do que nos faz andar, do que nos move, a partilha do espaço com outros habituais, do lugar amantes fiéis como eu, torna-o mais encantador. Não podemos eremitar e mantermo-nos felizes. A sociabilidade do ser é necessária à sua ventura. O individualismo provoca frio, petrifica o sentimento. A vida não nos foi dada para o isolamento. Ali, naquele lugar, de nome que mente, de gentes sãs, de férias e descanso, hei de continuar a querer ir. Ali, àquele lugarzinho de Portugal, que será sempre para mim lugarzinho, hei de querer voltar incessantemente. Onde quem está me recebe com vontade, onde quando não vou me estranham, onde haverá sempre o melhor ócio.
Princesa do Alentejo, até logo.

Sunday, July 5, 2009

Maravilhas de Portugal

Viajar é talvez uma das melhores formas de descansar da vida que a urbe tanto nos cansa. E qualquer que seja a forma, está no seu conteúdo a verdadeira viagem.
Pela tranquilidade e alienação total que proporciona, viajar no barco do avô sempre foi um dos maiores privilégios que tive. No mar, a terra é vista como um cenário animado, fazendo-me imaginar onde colocar cada pessoa, cada casa, cada experiência. Faz levantar o voo da imaginação, e deixa-me brincar com as peças, montando a cidade ideal e tão real como o imaginário o deixa ser.

Largando Lisboa rumando ao sul, deixa-se que o vento controle a velocidade e a rota, e navegamos durante dias até àquele que poderia ser considerado o mais belo paraíso luso para o descanso. Aquela que pode ser uma das mais belas praias de sempre. Ou um dos sítios que se pode classificar como um dos melhores destinos para esquecer a agitada rotina que nos atinge… Dobrando o Espichel, depois São Vicente, logo a ponta da piedade, e por fim Santa Maria, alinhamos o farol e o marco geodésico pelo través e aproamos à entrada do canal para a Ria Formosa. O vento dá-nos a tranquilidade e o silêncio do motor desligado, o sol consola-nos na manhã quente algarvia e leva-nos até à primeira bóia balizadora dos fundos permitidos.

Do bugio a São Vicente, para chegar a Lagos, precisámos de 2 dias. Avarias comuns, que mostram os ossos deste ofício ditaram as horas de saída. Foram duas manhãs perdidas em reparos e arranjos. Mas daqui íamos seguros que solidamente e sem que imprevistos ou traições do motor nos mudassem alguns planos para chegar ao mais ansiado destino. No diário de bordo ficou registado que em Sines, a primeira paragem, entrámos já passava das dez da noite. Para primeira atracagem desta tripulação, que velejava pela primeira vez junta, tudo correu bastante bem, não fossem as indicações do comandante as melhores, como nos habituara desde sempre.

Ao largo do último cabo que deixa a costa oeste para dar lugar à do sul, as escarpas dançam ao som das mais variadas cores e feitios. Procuramos pelo binóculo reconhecer em terra construções familiares, adivinhando estradas, vilas e lugares, onde sabemos já ter estado. A cada identificação uma vitória, uma peça encaixada na construção do mundo ideal. Do Portugal que gostamos e queremos. Do mar as vistas são as mais frágeis e as mais manejáveis. Dão-nos a sensação de uma supremacia ingénua e delicada, como que um domínio sobrenatural capaz de criar a perfeição pelo poder daquela imaginação.

Ainda o sol não estava a pique já nós estávamos fundeados na tranquila baía da ria, em frente à culatra. Essa tal ilha que, para mim, podia ocupar o primeiro lugar no ranking das melhores escapadelas lusas. Ali podíamos ficar dias e dias, sem qualquer urgência ou necessidade de civilização. Mas ficámos dois: o da chegada e o da partida. Não fossem os imprevistos técnicos que qualquer oficio está sujeito, estivemos naquele paraíso menos tempo que desejaríamos. A paz que pairava na paisagem ouvia-se como o cantar embalador dos sonos de criança. A praia, do outro lado da ilha, na preia-mar, oferecia-nos uma vista da mais bela natureza, desfocando qualquer sinal de construção humana, que pudesse estragar a fotografia. As cores que nos deu o sol no seu momento de recolha ficam além de qualquer tentativa de representação. Saem da imaginação, vendo a sua existência menos provável que o raio verde, que ainda se mostrou tão efémero como o nosso piscar de olhos.

Como poderei eu ter visto mundo antes de conhecer os paraísos que a minha própria terra oferece…? Mais reitero que aqui existe o que há de melhor no mundo.
Usando as ideias de Ortega e Gasset, ouso dizer que a paisagem é o meio, e cada um de nós vê a sua paisagem. Mas aquela paisagem que ali deslumbrávamos disse-se unanimemente magnífica, fossem quais fossem os olhos que a observavam. Entre todos concordámos a magnitude daquele lugar. E os meus olhos viam e sentiam a tranquilidade e o descanso de uma vida fora da vida, montada pelos sonhos, real como o sentimento do momento.
Obrigada Avô.
Até logo.

Thursday, February 21, 2008

Cidade Maravilhosa!

Os sentimentos andam a uma velocidade muito superior à capacidade de os exprimir, escrita ou oralmente. Nem a riqueza da língua portuguesa, que nos permite contar e encantar com floreados e ginásticas linguísticas, atenua a essa amplitude de velocidade… Difícil é transpor para o papel o que se viu, viveu, sentiu, da forma como se viu, viveu, sentiu… Mas a vontade da partilha ultrapassa a inércia e transforma a incapacidade de expressão em sensações escritas.

O patriotismo conhecido deste povo é vivido a cada passo. A paixão de ser brasileiro, de ser carioca, de viver no Rio, encontra-se em cada rua, em cada táxi, em cada loja. A discrepância social evidenciada a cada esquina mostra-nos a verdadeira vida desta cidade. As muitas favelas implantadas nos morros misturam-se com os luxuosos prédios de segurança redobrada, esbatendo a mescla de estratos sociais numa una forma de ser.

A chegada ao Rio de Janeiro foi, como tantas outras chegadas, demorada, muito demorada. Deixámos Puerto Iguaçu com a alegria de estar cada vez mais perto de casa, e com uma imensa vontade de finalizar esta longa jornada na cidade maravilhosa. No entanto um raio de tristeza conseguiu atingir-nos. A despedida da Lizze foi dura. Com ela tínhamos partilhado tanto desta nossa aventura, com ela vimos, vivemos, sentimos… A certeza de nos voltarmos a ver um dia, não tão longe como outros que nos passaram pela viagem, ficou marcada naquele “até logo” quando a vimos partir no seu autocarro com um destino diferente do nosso.

No Rio íamos ao encontro de conhecidos portugueses que, por diferentes razões moram nesta cidade. Este encontro com os meus conterrâneos criou-me um conflito de sentimentos. Deixou-me saudosa de casa aumentando a minha ânsia de chegar, e na barriga fez aquele pequeno remoinho que desassossega e atormenta. Sem perceber bem porquê sentia medo, ou nostalgia do que começava a acabar. Estava a perceber que chegáramos ao fim. A felicidade de uma realização que sentia ter sido bem sucedida, e a tristeza da consciencialização do terminus da mesma realização pareciam pares de lágrimas a descer na mesma velocidade e proporção.

Mas a recepção lusa no país do Samba foi a melhor. Não havia quem não nos desse o seu tempo. Intercâmbios de estudantes e o consulado português foram a nossa casa, os nossos anfitriões. No momento da chegada, o calor era muito e com uma força que desarmava, a cidade era nova e desconhecida, a procura dos amigos tardava por acerto de pormenores de futuro, o trânsito era denso e confuso, a vida corria na banal e agitada rotina urbana… Há mais de todas as horas que fazem um dia que estava em viagem, já uma cama me chamava há que tempos… só ela me podia salvar daquele esgotante e aniquilador cansaço. Mas finalmente encontrámos os prometidos Amigos o que deixou o meu cansaço descansar pelo descanso que se adivinhava para breve. Mesmo tardando o breve, continuava a euforia da chegada à cidade maravilhosa. Euforia que me trazia rasgos de amnésia sobre a tal fadiga extrema, e a hospitalidade desde o primeiro segundo daqueles já donos da cidade encantou-me. Começava a realizar que estava no Rio de Janeiro, aquela cidade que há tanto ansiava conhecer.

Foi uma sensação estranha e confortável ao mesmo tempo. Tudo me parecia familiar fazendo-me sentir que já aqui estivera antes. Era a realidade mais colada ao imaginário que alguma vez eu tinha presenciado. Era tudo tal e qual como no meu inventado. Ver tudo aquilo ao vivo encheu-me a alma… como pode uma não surpresa surpreender tanto?! Mas naquela envolvente conhecida do meu imaginário não havia o cheiro, o ar, a cor, o ambiente… o despertar de todos os sentidos fez-me vibrar, apaixonar-me. Tudo o que poderia ter ouvido falar desta cidade ficara aquém do que a realidade me mostrava. Não há praia urbana mais bonita… Deambulando pelo calçadão não me cansava de observar o rodeio… não havia sentido que não despertasse e não fosse usado a todo o seu potencial.

Depois de todos os lugares por onde andámos, foi aqui que chegou o medo ou receio de andar na rua… Só aqui me senti ameaçada ou apreensiva com o badalado perigo da cidade do Rio. Mas não foi uma insegurança espontânea. Foi uma apreensão provocada pelos imensos e constantes avisos sobre a metrópole perigosa. “Não exibas nada de valor”. “Esconde a carteira e leva o dinheiro separado em vários sítios”. “Não resistas a qualquer tentativa de assalto”. O sobreaviso despoletou em mim o medo. A ignorância torna-nos bravos deixando-nos enfrentar muita coisa, mas às vezes pode nos deixar demasiado à vontade. Os avisos são bons. Aqui, no Rio, a minha bravura veio com o tempo. Num princípio, quando andando sozinha na rua, no autocarro, à beira mar, na praia, tudo o que se dirigisse a mim era ameaçador, mas com o passar do tempo, com a libertação da preocupação, tomam-se todos como normais transeuntes de uma normal cidade. Volta-se a desfrutar do encanto daquela luz, daquela vida alegre, daquele movimento contagiante, volta-se a querer fazer parte dele, deambulando como carioca puro, parando na lanchonete para um chope, atravessando a rua ocupada de carros para estender a toalha na praia e mergulhar naquele azul imenso que me faz lembrar o desaguar de uma metrópole cansada no seu leito de ócio.

A estada no Rio foi curta. Foram 9 dias que souberam a pouco. A chuva que nos recebeu durante os primeiros 3 dias tomou as culpas, claro. Impediu-nos de viver a cidade como merecia. Mas a hospitalidade que me recebeu no consulado português atenuou com força a indesejável chuva, fazendo daquela tarde uma das melhores da estadia no Rio. A ver o dilúvio cair no largo verde que saía da varanda da casa, abraçadas pela boa conversa, não apetecia que o dia acabasse… Nem a favela Dona Marta, aquela que se vê da residência consular, de onde podem saltar tiros perdidos em dias de mais alvoroço, nos tirava a vontade de ali estar.

Foram poucas as visitas culturais sobre a cidade. Foram alguns os sítios que apesar da vontade, ficaram por visitar… Na Lapa, esse bairro típico do Rio profundo, é onde moram as irmãs da madre Teresa de Calcutá. Acompanhando uma das habituais visitas da consulesa, pude visitar o trabalho destas irmãs na cidade do Rio, constatando mais uma vez a uniformidade mundial desta ordem do sari branco.

Mas o Cristo redentor, premiado com o título de maravilha do mundo pouco antes de lá chegarmos, não pôde deixar de ser visto! Dali se verifica a grandiosidade desta cidade… dali se contempla o cheiro, o ar, a cor, o ambiente, únicos que se vive nas ruas da mais bela cidade do mundo. Dali se percebe porquê o cognome – a cidade Maravilhosa!

Até logo.

Tuesday, January 15, 2008

O rio Iguaçu

A nascente mais viva e mais caudalosa do mundo será a do rio Iguaçu, a força com que ele cai a pique pela garganta do diabo faz imaginar que toda a água que existe no mundo está ali. Não é possível tanta água junta ao mesmo tempo... O seu enorme caudal, provocando constantes problemas de cheias nas povoações das suas margens mostra a força deste leito, a sua bravura… Até o seu curso normal foi alterado pelo homem fazendo criar o ponto zero deste rio numa zona onde a subida das águas não devastasse tanto.

O rio Iguaçu nasce da junção de dois rios brasileiros, o Iraí e o Atuba, e vem desaguar num canto de fronteiras entre Argentina, Brasil e Paraguai, no Rio Paraná na povoação brasileira de Foz do Iguaçu. Chega ao canto, parecendo não ter para onde ir, cai em queda livre por penhascos gigantescos, continuando a correr com a força de um rápido obrigando o barco “todo o terreno” a usar de toda a sua potência na “tracção às 4 rodas” para o vencer. Lutando contra a corrente, o barco cheio de turistas sentadinhos e alinhados, de colete vestido, aproxima-se o mais que pode do fim da imensa queda de água que os encharca num segundo. Como não podia deixar de ser, também vestimos o colete para partilharmos da mais impressionante aproximação à base das cataratas... eu não vi nada, pois a água não deixou, mas ficámos bem molhadinhas.

O destino escolhido para deslumbrar esta obra-prima da natureza, património da humanidade, foi a cidade de Puerto Iguaçu, uma pacata e tranquila povoação no norte argentino que alberga quem quer vir ver os encantos das quedas de água. Por (in)disponibilidade de autocarros ficámos 3 dias nesta cidade. Vínhamos da agitada vida de Buenos Aires e ansiávamos descanso, tranquilidade e natureza. A viagem de mais do que as suportáveis horas de camioneta deixou-nos às 3 derreadas, e a procura de um bom sitio para ficar era mais urgente que nunca. Sucumbindo ao cansaço fomos com o primeiro assédio que nos interceptou no terminal de autocarros. Descansar era a prioridade, mas tratar dos próximos passos era necessário. Então, antes que a fraqueza nos atingisse, saímos em busca dos planos futuros – marcar a visita às cataratas e decidir a ida para o Rio de Janeiro, nosso próximo e último destino. Feitas as agendas era o dia seguinte o dia de visita aos maiores saltos, em volume, de água do planeta.

A ida para casa estava cada vez mais perto. A vontade de parar já me tinha abordado várias vezes, camuflando ou mesmo quase abafando a vontade de continuar a procurar os melhores tours para rondar as tão ansiadas cataratas. Mas era ali que estávamos, era aquilo que tínhamos escolhido e querido ver. E queríamos de facto estar ali. Fazendo a razão prevalecer sobre uma emoção criada por cansaço e saudade, fazendo-as mudar de posições, mal podia esperar pelo dia seguinte. Eu já só pensava no que poderiam ser essas enormes quedas de água que segundo a lenda foram criadas pela fúria do pai da princesa índia Naipí que ao vê-la fugir com um índio numa canoa pelo rio abaixo, abre as enormes fendas no curso do leito Iguaçu fazendo-os cair pelo abismo e transformando o índio numa palmeira e a princesa numa pedra junto da queda de água, de maneira a que os dois nunca se tocassem, apenas se vissem…

Muitas são as formas de visitar estas enormes cataratas. As diferentes perspectivas têm diferentes nacionalidades. A argentina foi a nossa escolhida. Passámos um dia inteiro a deambular pelos imensos pontos de vista da paisagem. Aquela aproximação de barco ao sopé da enorme cascata não me permitiu abrir os olhos nem quase respirar, deixando-me apenas uma sensação… sem imagem. Mas entrando pelos caminhos a dentro a pé, o espanto aparecia a cada ponto de vista. Quando já parecia que tudo estava visto, mais uma imensa linha de cataratas e cataratas seguidas surgia por entre a densa vegetação local. O meu queixo caía como a força da água, a beleza da paisagem deixava-me perplexa. Que imponência!


Foram 3 bons dias na povoação de Puerto Iguaçu. A visita às quedas de água deixou-nos espaço para a vontade de não fazer nenhum até chegar a hora de partir outra vez. Passeios e banhos no rio perto do hotel souberam a descanso ansiado e merecido. Ainda convencidas que merecíamos sempre uma boa distracção e convívio, deixámo-nos ir experimentar mais um belo repasto argentino na companhia do seu conterrâneo vinho. A companhia da Lizze deu-nos mais ânimo ainda. Com mais uma pitada de insistência vinha connosco para o Rio, mas a vida continua, os caminhos eram outros e a separação era inevitável. Dali sabemos que levamos uma amizade, com a certeza de a vermos em Portugal um dia (tal não terá sido a nossa tão eficaz publicidade ao pacato e maravilhoso país da cauda da Europa…).

Até logo!