Thursday, May 17, 2007

A fronteira do Cambodja

Foi passada a pé a arrastar as malas. Senti-me no tempo em que não havia estradas, nem carros, onde o único meio de transporte eram animais, ou o próprio pé… Antes do carimbo que finaliza a permissão de estada no Vietname, que nos diz que saímos mesmo deste país, apanhámos um barco, um autocarro e outra vez um barco. Eram dois dias de viagem desde Ho Chi Minh até Phnom Penh, com direito a dormida no meio e a uma visita pelo dia-a-dia do Mekong Delta. Ao princípio parecia mais do mesmo, do que já tínhamos visto na excursão anterior, mas afinal acabou por ser, tal como muito se diz por estas bandas, “same same… but different”.


Ao chegarmos ao posto fronteiriço entre os dois países, pelo quase inavegável rio que atravessa os países da Indochina desde do Tibet até ao Vietnam no Sul, esperamos pacientemente pelas burocracias legais. Comemos qualquer coisa e seguimos. Afinal estou no mundo moderno, levo a mala a passar no scaner garantindo idoneidade, recebo mais um carimbo, o que me deixa entrar no Cambodja e de novo ao barco. O scaner continua o único vestígio de modernidade aqui… o embarque é feito descendo a ladeira que quase atinge os 45º, da margem do rio, saltando para o barco que está preso apenas por um tipo que segura o cabo. Sem escorregar entro antes da mala trazida por um pequeno local estrategicamente posicionado para recolher mais uma gorjeta do turista… Ainda bem que existem! Ou já me via a nadar nas águas castanhas do Mekong sem saber da mala e do destino…

Seguimos viagem pela zona larga e de trânsito do mesmo rio, apreciando a paisagem até pisarmos terras cambojanas. O desembarcar foi tão ou mais inóspito que o anterior embarque. A ladeira declinava ainda mais, uma pequena tábua, bamba e escorregadia da lama ligava o barco a terra. Mais um salvador pequeno local encaminha a minha mala… Já só faltava uma viagem de autocarro até chegar a Phnom Penh, a capital deste tão selvagem e diferente país. A primeira impressão foi não fechar a boca. Tudo em obras. Um país que recupera de milhares de anos de guerras e invasões, e dos brutais tempos sob as regras do Kmer Rouge, que conhece a paz há escassos anos e onde até então não houve possibilidade de definição de sistema, nota-se que estás em arrumações de quem se mudou há pouco por imposição de alguma força maior. Mas o povo é simpático, afável, sem pelo na venta como o anterior. Mostra carinho e submissão querendo agradar sem ter de ser agradado.


Em Phonm Penh ficámos apenas o tempo de poder seguir para Siem Riep, a terra do Angkor Wat e seus templos construídos pelos Kmer Rouge, no século XIII. Para se visitar todos os templos são necessários 3 dias. Antiga cidade habitada pelos seguidores deste regime, que em modestas casas de madeira perdidas no meio da selva, admiravam os imensos templos de pedra onde os Deuses encontrariam um lar. Das casas de madeira não sobrou nada, foram totalmente destruídas por quem esteve no poder depois dos Kmer, que pela fúria dos mal tratos e massacres deste regime tentaram não deixar rasto do que foi o genocídio… Mas os templos, esses, desde sempre que resistem a qualquer tentativa de destruição.


A chegada a Siem Riep foi tranquila, apenas mais uma viagem de 6 horas de autocarro, com as típicas paragens em bancas de beira de estrada que nos oferecem fruta aquecida pelo sol, ou variados insectos grelhados, que eu evito por razões obvias da minha diminuta mas não inexistente esquisitice gastronómica. No fim da viagem, como num verdadeiro país da Ásia, milhões de homens de rickshaws (aqui chamados Tuc Tuc) invadem-nos com ofertas do transporte mais barato, ainda sem sequer termos um preço base. Escolhemos o mais persuasivo, que por elegermos a guest house do seu irmão nos leva de graça...

A vista aos templos no primeiro dia foi feita de bicicleta. Percorremos o circuito pequeno pela densa e bravia paisagem que a todo o momento nos pede uma fotografia, passámos pelo Angkor Thom e acabámos no grandioso Angkor Wat, um dos favoritos ao podium das maravilhas do mundo! A estação das chuvas deu-nos o templo vazio de turistas a observar o mundo pela objectiva da câmara, mas deu-nos também a maior molha de sempre na volta a casa… Para o povo asiático a chuva não é ameaça, para nós também não pôde ser…

No dia seguinte andámos 70 Kms de Tuc Tuc, mais uma vez acompanhadas por Herman e Veerle, um casal Belga que vive em viagem há largos meses que tão boa companhia e lições da cultura deste lado do mundo nos deram.

O caminho até esse longínquo templo mostra-nos mais deste inóspito país. Ao longo de toda a estrada vêem-se as casas de saias arregaçadas a prevenirem-se dos constantes e repentinos aguaceiros da época molhada, onde nos momentos secos também servem de acolhimento. Para além da beira da estrada pouco ou nada está povoado. As minas que ainda podem existir no subsolo proíbem qualquer hipótese de desbravar aquela selva… Virão em tempos próximos as brigadas anti minas? Ao mais destruído dos templos fizemos uma escalada por entre pedras e arbustos, ajudadas pelos simpáticos guardiães do nada que com o seu pobre mas sincero inglês me explicava por onde ir e ao que tirar fotografia. Here… Picture… foram as duas únicas palavras que ouvi em todo o percurso. Uma delicia pura à qual não se consegue resistir…

A nossa estada em Siem Riep derrapou 3 dias. A cidade é tranquila, o povo é simpático e a oportunidade de visita às Irmãs da caridade apareceu. Aproveitei para me dedicar à escrita, conseguindo lançar um post em tempo real e desenvolver mais textos sobre o sector das organizações sem fins lucrativos. Para o Laos vamos de avião, pois as escassas estradas do Cambodja obrigam-nos a dar uma volta de 2 dias…

Até logo!

5 comments:

Anonymous said...

Isto é mto Lara Croft...genial!

lee said...

Qual MST, RRA é que é!

Sempre a andar Rita! é assim mesmo!

bjs azuis com-calorrrrrr! :)

MRA said...
This comment has been removed by the author.
MRA said...

Querida Rita,
Gosto de seguir os teus itinerários... e sentir o peso da história, a tua e a dos povos e lugares que visitas.
beijos

Rita Bettencourt said...

Mais uma vez adorei! Concordo, é mesmo Lara Croft!

Bjs

Rita