Não querendo perder o sentido cronológico deste diário de uma viagem, não posso deixar de referir acontecimentos que mesmo que marginais ao curso normal dos 360, merecem um pequeno escrito pela forma como influenciaram a entrada de novo na rota inicial.
Foram quase 3 semanas que os casamentos de uma afilhada e de um irmão nos levaram a casa. Compromissos familiares que de maneira nenhuma queria deixar de cumprir fizeram um intervalo na nossa rota. Não por obrigação, mas por muita vontade a situação proporcionou-se e deu para seguir o desejo. Ao princípio assustava-me a ideia de parar a meio de algo que me fazia pensar ser sem intervalo possível, como é que eu, algures em parte incerta da Ásia iria conseguir ir passar uma temporada a Portugal? A escolha tinha sido embarcar numa viagem longa e contínua pelo mundo... Mas a verdade é que a vontade de estar, pelos acontecimentos que justificavam a vinda, era forte e acabou por fazer sentido uma separação da viagem em duas etapas. Esta viagem não tinha de ser longa e contínua, tinha de ser como eu quisesse que fosse. A quebra foi exactamente a meio, em termos de objectivos, e mesmo até de cansaço... Uma vida de nómada, de vaguear por aí, de poder partir à aventura sem irresponsabilidade desmedida, todos um dia invejamos ter. Eu tive a sorte da oportunidade me bater à porta, muito pela mão da Carmo, que deu o primeiro chuto numa bola, que acabaria por rolar mais do que se imaginara ao príncipio, quando me propôs juntar-me à já fixa ideia dela. Agarrei a oportunidade, deixei rolar a bola e segui o instinto mais real que alguma vez senti. A decisão foi a melhor, deixei-me deambular pelo correr dos acontecimentos até à hora da partida, apercebendo-me mais tarde, que só esta tinha sido a verdadeira consciencialização de que tinha tomado a mais diferente e bruta decisão da minha vida, até agora. Foram 4 meses de euforia, loucura, descoberta do mundo, de mim, dos outros, de casa, de tudo. Foram quatro meses que me deram muito, fizeram-me crescer e ensinaram-me imenso.
A vontade de parar, de interromper esta viagem que tanto me trazia, que tanto gozo evidente me estava a dar, ia crescendo à medida que o dia se vinha aproximando. Vejo-me a sentir um crescente de saudade, que nunca antes havia sentido, mesmo em alturas mais sensíveis que por serem especiais choram por um abraço real. A saudade é um sentimento que cresce na razão inversa ao tempo que falta para cessá-lo. Quando saímos por muito tempo, aparece pouco no princípio camuflado pela vontade de partir para o desconhecido, pela expectativa, e vai crescendo ao longo da consciencialização de que estamos longe e às vezes sós... Enquanto há descoberta não há espaço nem tempo para pensar que estamos afastados do nosso meio, a euforia rouba-nos a nostalgia e deixa-nos entretidos na procura, na observação, no conhecimento… Quando se anda a viajar tudo se enfrenta com o encontro desta nova vida de nómada, de não pertença, de às vezes vazio… Mas este vazio, que se aproveita de um mínimo momento de fraqueza, traz de repente ao pensamento a variável tempo. O crescimento deste sentimento que tanto nos dá alento à vida, dispara de forma desmedida, parecendo não querer parar tão cedo, parecendo asfixiar, deixando-nos sem recuperação possível... Sentimo-nos sem chão e sem norte. O sentimento toma conta de todos os espaços à minha volta, trazendo quase a vontade de voltar a casa e de desistir de tudo. Tudo se transforma em monstros indomináveis, tudo fica fora de controlo… Mas claro que tudo isto passa com um esfregar de olho do diabo, e no momento imediato estamos a dar graças à saudade por nos aquecer como um cobertor num momento de frio inesperado. A saudade traz-nos à memória todo o alimento para a matar. É ela um sentimento que nos mata e que nos faz viver ao mesmo tempo. Muita coisa vi, por muito sitio andei, muitas pessoas conheci, muita bagagem nova trago comigo para a viagem maior de todas, a da vida. Quando com tudo isso ao de cima, fresco e fazendo-me crer que estou carregada de novos combustíveis que fazem andar qualquer veículo que nos transporta, vejo-me em casa a apreciar de outra forma, com outro olhar, com a descoberta de sentimentos escondidos na certeza das certezas evidentes, que por o serem não emergem nunca, um pôr do sol que para mim é especial.
Agora parto para mais uma etapa da viagem, com forças e vontades que por saber ao que vou e ao que volto, são ainda maiores que as que tinha na primeira partida.
Até logo.
9 comments:
Verdadeiramente à solta. Conhecer-se e dar-se a conhecer só toca aos superiores.
Gostei muito.
Muito giro a evolução das duas que mostra bem o acerto da decisão acho eu.
Fico comovidissima a ouvir o que escreve e cheia de saudades e vontade que voltem...
muitos beijinhos da avó Xanxa
Querida Rita, nunca aqui tinha vindo fazer o comment oficial, embora te siga desde o inicio...mas hoje, estando tb eu longe de casa, noutra ponta do mundo, e tb quase a voltar da minha jornada (infinitamente mais pequena e menos emocionante e corajosa, mas mesmo assim uma jornada!) senti-me mto perto de ti pelas palavras bonitas e verdadeiras que escreveste! Um beijinho cheio de saudades tuas.
Matilde
Olá Rita, como é que se consegue dar a volta à vida e seguir por um determinado caminho sem ter medo?
Eu estou cheia de medo de arriscar para ir viver para Londres que é aqui tão perto... e deixar tudo para trás... como é que se arranja coragem??
...Estou sem palavras! Como sempre, muito me ensinas com a tua própria vida e o teu próprio testemunho! OBG!
Muitos Beijinhos!
Madalena
O pôr do sol pelas tuas palavras tem cores...incríveis!
bjs azuis e sineses! lee e pê aqui de férias
Querida prima
fiquei completamente emocionada com o que escreveste.... fico cheia de saudades.
beij
mariana
rita
gostei imenso
bj
tconstança
para mim foi essencial estar contigo nestas férias.
obrigada. pelo sorriso ao chegar, pelas risadas nos casamentos, pelas conversas em vila nova e muito essencialmente por este post.
beijinho saudoso
teresinha
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